terça-feira, 25 de junho de 2019

"Não deis aos cães o que é santo nem deiteis aos porcos as vossas pérolas." (Mt 7, 6)

Estas palavras de Jesus, que escutámos no Evangelho da missa de hoje, são uma advertência para nós que, tantas vezes, confundimos o essencial com o acessório (damos aos cães o sagrado e pérolas a porcos); tantas vezes valorizamos excessivamente realidades que não têm assim tanta importância para a nossa vida e para o nosso bem e relativizamos (quando não desprezamos mesmo)outras que são de extrema importância ou mesmo essenciais na nossa vida.
Ao nível meramente humano, é fácil identificar duas ou três realidades essenciais, às quais devemos dar, portanto, o máximo valor. A primeira delas é a própria Vida, sustentáculo e base de todos os demais valores e outros direitos, à qual está intimamente ligado o valor inestimável da Saúde. Além destes dois valores essenciais à nossa existência, ainda identificamos como imprescindível à verdadeira felicidade humana, o valor da realidade Família. Estes são, também segundo a perspectiva cristã, os maiores valores do ser humano, essenciais para se garantir a sua própria dignidade. Haverá, certamente, outros como a Paz, mas já de outra ordem.
Também no âmbito da nossa condição cristã, há valores essenciais à fé e à vida. São os quatro elementos, quatro pilares sobre os quais se constrói a existência cristã (o quadrilátero cristão), como as quatro pernas duma cadeira (que fica desequilibrada e cai se lhe faltar qualquer delas), da mesma forma a vida cristã é desequilibrada ou deficiente se a pessoa descurar ou omitir qualquer deles. São eles: a Oração, a Palavra de Deus, os Sacramentos (com especial relevo para a Eucaristia frequente) e a prática da Caridade, o mandamento de Jesus.
Sete valores, no total, essenciais à vida duma pessoa cristã que queira viver equilibrada e dignamente. São estas, portanto, as nossas "pérolas", as realidades "sagradas" que não podemos lançar aos cães ou aos porcos.
Ora, olhando à volta, auscultando o mundo cultural em que vivemos, sobretudo na Europa, o que constatamos? Sem grande esforço verificamos (generalizando) que a cultura europeia menospreza, ataca, ridiculariza e despreza mesmo todos esses valores (talvez por serem radicalmente evangélicos). Senão vejamos: a profusão de leis contrárias à vida humana ou pouco valorizadoras da mesma (aborto, eutanásia...) em muitos dos estados europeus; promulgação de leis igualmente lesivas ou adversas à instituição familiar e ao seu equilíbrio, também como berço da vida; o descurar e descuidar dos sistemas/cuidados de saúde por parte de quem manda (em Portugal é crónico...); uma certa "cultura de morte" que se vai expandindo e entranhando em muitos aspectos sociais do chamado primeiro mundo na actualidade.
No que respeita aos valores-base da vida cristã (Oração, Palavra de Deus, Sacramentos, Caridade),assistimos a uma evidente e constante ridicularização dos mesmos por parte daquilo a que podemos chamar opinião pública ou sentimento generalizado da sociedade europeia actual. com que facilidade vemos atitudes e reacções de desprezo, ironização, exposição ao ridículo, desvalorização e até "gozo" em relação a quem reza, a quem pratica os Sacramentos, a Eucaristia ao Domingo, a quem se dedica à prática cristã da Caridade autêntica, a quem mostra estimar a Palavra de Deus e se esforça sinceramente por viver os valores do Evangelho!
Por tudo isto, devem os cristãos ter consciência do mundo em que vivem. como alguém bem autorizado insistia há décadas, saber ler os "sinais dos tempos". E nós, portugueses/europeus, nesse aspecto, temos de ter consciência de que a nossa cultura não é, actualmente, nada favorável nem concordante com os grandes valores do Evangelho que enformam o pensar e o agir cristãos (e que, ironia das ironias, inspiraram e presidiram à própria construção da civilização europeia e ao projecto comunitário da Europa). É preciso, acima de tudo, lucidez e honestidade intelectual, sem medos nem subterfúgios nem falsas ilusões, para fazer o diagnóstico e assumir que este é o mundo em que estamos e onde temos o dever de ser sal e luz como manda o Mestre.
É Ele que, ao terminar o ensino de hoje, nos recomenda: "esforçai-vos por entrar pela porta estreita! pois larga é a porta e espaçoso o caminho que leva à perdição e muitos são os que seguem por eles. Como é estreita a porta e apertado o caminho que conduz à Vida e como são poucos aqueles que o encontram!" Mais um apelo forte a não nos conformarmos ao mundo, mas a sermos, nele, sinais de contradição.

25-VI-2019

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